Resenha: How to be a GURPS GM


À primeira vista, How to be a GURPS GM não me causou uma boa impressão. Talvez pela baixa qualidade do livro impresso: capa mole (papel comum), diagramação deixa a desejar (um problema recorrente nos livros da linha GURPS), poucas páginas para o que eu estava imaginando.... Confesso  que, quando comecei a folheá-lo,  não fiquei muito animado.

Há alguns meses estava “namorando” sua versão digital, publicada em julho/2017. O livro foi escrito por Warren "Mook" Wilson (mestre de GURPS desde 91, escritor de diversos livros de ficção) e Sean "Kromm" Punch, conhecido editor da linha GURPS desde 95, incluindo a sua participação na produção da quarta edição, diversos artigos e forums e sites na internet.


E em outubro tomei conhecimento de uma promoção na Amazon Brasil. Empolgado o comprei juntamente com outro livro: Fantasy Art& RPG Maps (de  qualidade visual excelente por sinal!)... Talvez por receber os dois juntos e perceber a diferença de qualidade nos dois livros logo ao manuseá-los pela primeira vez, a minha decepção aumentou: comparando-se a capa, ilustração, etc percebe-se que falta muito à editora do nosso querido sistema um investimento em estética! Algo que, por exemplo, a WOC sabe fazer magistralmente com D&D...



Não obstante a qualidade tenha me deixado desanimado, pelo título do livro eu esperava encontrar todas as informações sobre como criar uma campanha, criar uma aventura, tocar uma sessão, ser um bom mestre de GURPS! Esperava que todas as regras estivessem compiladas no livro, mas ao invés disso, já nas primeiras páginas ele citava os capítulos das regras para criação de campanhas e aventuras no MB Personagens e Campanhas, além de duas referências externas: GURPS for Dummies e Robin’s Lawof Good Gamemastering (ambos livros que eu não tenho).

Foi um “balde de água fria”  para o que estava esperando....Contudo, eu decidi dar uma chance ao livro e resolvi lê-lo na integra: foi quando me deparei com o primeiro parágrafo, logo no início do Introdução, e impactado pela introdução apresentada por Mook e Kromm, minha opinião começou a mudar:


“GURPS é um incrível robusto jogo de RPG que proporciona consistentes e flexíveis regras para jogadores e mestre que querem se divertir em todas as formas de aventuras, em todos os níveis de poder, em todos os tipos de gênero.

Por causa de sua universalidade, ele é uma ferramenta muito mais abrangente que outros sistemas de escopo restrito. Quando você esbarra em GURPS não encontra um modelo para construir uma carro ou um aeroplano. Você encontra um ilimitado conjunto de blocos capazes de construir automóveis, caminhões, aviões, zepelins, submarinos, motocicletas, naves interestelares, estações espaciais, ou qualquer coisa que quiser! O Mestre de GURPS é encorajado a visualizar o jogo que ele e seus jogadores querem, e então usar apenas aquelas regras que suportam sua visão, ignorando qualquer outra.”
How to Be a GURPS GM, pg 4, minha tradução



GURPS é um "sistema para fazer sistemas". Isso é fato. E eu compreendi que o objetivo do livro não era especificar todas as regras disponíveis para o GM, até porque, considerando sua universalidade isso é uma missão impossível. As particularidades de cada gênero e cenário são infinitas. Há centenas de vantagens, desvantagens, pericias, magias, perks, técnicas; milhares de artigos e páginas de regras opcionais. E a grande maioria não são apropriadas para todas as campanhas. 

Cabe salientar que o "core" do sistema é simples: pegue um parâmetro, jogue três dados D6 e compare: se o resultado for menor o pj foi bem sucedido! Esse parâmetro pode ser um atributo, um nível de habilidade de uma pericia por exemplo. Quantos sistemas trabalham com jogadas de dados de formatos diferentes (usados em cada atributo ou tipo de jogada), múltiplas jogadas, percentuais de acerto? 

E a criação de PJs? Bem, ela pode ser facilitada pelo mestre usando por exemplo modelos e templates pré-construídos, emulando as classes, raça, profissões. Na verdade,  por meio de sua característica modular, o GURPS transfere a responsabilidade para o GM e não para o jogador. E na minha opinião, é um trabalho agradável porque dá total liberdade para o mestre construir o universo da maneira que desejar. É laborioso sim, em um primeiro momento, mas uma vez concluído, todo esse esforço é satisfatório pois facilita a vida dos jogadores (e no final do GM).

Ao aprofundar a leitura, logo, percebi claramente que o que o livro propõe é dar subsídios mínimos para qualquer um poder mestrar o sistema - mesmo novatos em GURPS -  direcionando o mestre para o que ele realmente precisa! É dar ao GM as referências e dicas para que ele saiba estabelecer os limites de sua campanha. Os autores enfatizam que estabelecer limites em GURPS é mais importante do que em outros sistemas mais superficiais, pela sua característica genérica. Não significa autoritarismo ou excesso de controle por parte do GM, mas uma uma questão crucial para tornar o jogo divertido e adequado a campanha e ao gênero!

Percebam então que, pela falta de experiencia, muitos mestres novatos caem nesse erro básico. Empolgados em abraçar todo o sistema tentam introduzir todas as regras e acabam por tornar o jogo inadequado, a aventura pouco palatável aos jogadores. Esse é um erro crasso que mesmo nós mestres veteranos muitas vezes também cometemos! E daí vem a fama do sistema ser complexo, difícil e chato! Por exemplo, em aventuras oneshot para novatos já mestrei sem nem mesmo adotar as regras de defesa ativa ou ponto de impacto para os inimigos "bucha de canhão". Dependendo do dano da escopeta narrava assim: "Pronto! você acertou na cabeça! Ela explodiu em milhões de pedaços!"



Assim os autores abordam em sete capítulos toda a gênese e vida da narrativa, desde a concepção da campanha até a sua conclusão. O primeiro capítulo contém:

  • os recursos necessários para criação de personagens e campanhas (referenciando os capítulos nos Módulos Básicos);
  • relaciona os suplementos por gênero (fantasy, horror, space, supers, etc); por cenários (Banestorm, Infinite Worlds. Transhuman, Traveller, etc); por Livros de Regras (Powers, Martial Arts, Mass Combat, Spaceships, Magic, Thamatology, etc); Catálogos (Lowtech, Hightech, Ultratech, Creatures of Night, etc), Aventuras (Caravan to Ein Arris);
  • estabelece a escolha do gênero, quais livros serão adotados, o estilo (realista ou cinematográfico), quais regras serão adotadas (incluindo regras da casa),  nível de poder. características que serão permitidas ou proibidas (nivel máximo de atributos, vantagens, desvantagens, pericias, equipamentos, magia, poderes, raças etc);
  • explica as diferentes abordagens que o mestre pode adotar para criação dos personagens (será uma criação imposta com fichas prontas ou templates, em conjunto com o jogador por meio de uma colaboração narrativa/criativa ou totalmente realizada pelo jogador apenas com a aprovação/veto final do mestre?); quais são os prós e contras de cada abordagem?
No capitulo dois, o livro apresenta, na pratica, um exemplo de criação de uma campanha enfatizando uma abordagem de criação de pjs colaborativa e usando templates. 

No capitulo três, referencia as regras para criação de aventuras, criação de encontros, enredos, NPCs, locais e cenas. Nos encontros ele aborda a importância de envolver todos os jogadores  e portanto a variedade de circunstâncias e de testes de pericias que podem ser aplicados. Enredos podem ser lineares ou dinâmicos tendo seus prós e contras. Como equilibrar os NPCs por exemplo para situações de combate. Como equilibrar um combate usando o cenário. Reviravoltas e consequências das ações dos pjs. O capitulo quatro complementa esses conceitos apresentando um exemplo de uma aventura baseada no cenário citado no capítulo dois.

O capítulo cinco aborda como o mestre deverá desenvolver a aventura: antes, durante e depois dela. Oferece dicas de como ele deve se preparar: planilhas de controle, cartas de combate, escudo do mestre, livros, mapas, fichas, lápis, papel, borracha, e é claro comida!... Salienta a importância da socialização antes de começar a sessão; sobre recapitular a ultima aventura (se for uma continuação); e abrir para perguntas dos jogadores...

Durante a sessão ele sugere que a aventura comece com alguma ação chamando a atenção dos jogadores, sempre buscando incluir todos os pjs e suas habilidades. Adaptar a aventura às ações dos pjs de modo que a narrativa seja dinâmica e fluida: e por que não tentar novas coisas? E por fim, sempre buscar encerrar a sessão em um clímax, do modo a manter a expectativa dos jogadores pela próxima sessão de jogo!

Depois da sessão é o momento de dar as premiações, pedir por feedback e sugestões, usar o tempo (planilhas de uso do tempo podem ser uteis), etc. A combinação de aventuras geram campanhas e o livro também menciona a respeito da evolução dos pjs a longo prazo, de modo que a narrativa flua naturalmente. Por outro lado, o GM deve esperar por mudanças na expectativa do grupo e sempre estar preparado para se adaptar!

O capitulo cinco para mim foi o mais interessante de todos, o que mais agregou valor, tanto como mestre e jogador. Ele aborda o combate e como customizá-lo e otimizá-lo para sua campanha (ou pj!). Ele serve tanto para mestres em seu trabalho de tornar o combate algo divertido em suas aventuras como para jogadores poderem tirar o melhor de seus pjs!

Neste capítulo, primeiro apresenta dicas de como usar a letalidade, adequar a  velocidade e o realismo em seus combates. citando os dois extremos: Menos opções, jogo rápido e menos detalhes versus Mais opções, jogo lento e extremamente detalhado, mencionando inclusive quais regras devem ser utilizadas entre esses extremos.  Na segunda parte do capitulo, aborda dicas para influenciar os combates otimizando PJs e NPCS por meio do uso dos atributos certos, vantagens, pericias e técnicas. 

Ele também explica as particularidade de cada um dos quatro principais estilos de combate: arma em uma mão, duas armas uma em cada mão, arma de duas mãos e por fim arma e escudo. Ele exemplifica apresentando seus prós e contras. Também aborda o uso da sorte, magia e poderes psíquicos em combate, como melhorar o ataque e a defesa, como sobrepujar as defesas do inimigo. O interessante desse livro é que ele compila todas as regras de combate de uma forma simples e fácil para o mestre ou jogador poder consultar. Vale ressaltar que ele não aprofunda nas regras mas cita as referências para quem quiser saber mais, o que já é de grande utilidade.

No capitulo final (sétimo) os autores continuam o exemplo dado (no capítulo quatro) desenrolando a aventura. Sinceramente, particularmente não me agregou valor, porém creio que com certeza é útil principalmente por apresentar para novatos de forma mais didática o desenvolvimento da narrativa mediante exemplos.

De modo geral, How to Be a GURPS GM é um um bom livro oferecendo aquilo que foi proposto: uma bússola para orientar mestre novatos (e mesmo alguns veteranos) na infinidade de regras opcionais do GURPS, dando mais segurança à narrativa. Um manual de referencia para criação de campanhas e aventuras. Embora ele peque na qualidade e material que foi feito, dado sua utilidade para as mesas,  eu o recomendo para qualquer mestre novato. 

PS: O livro obviamente é importado (em inglês). Pode ser adquirido na Amazon clicando AQUI. Embora a Amazon alerte  que demorará 30-60 dias para entrega, ela entregou com menos de 20 dias, sendo que apenas efetuou o débito no cartão de credito quando o livro já estava no Brasil (em poder da Amazon Brasil). A partir do momento que confirmou o debito chegou em três dias!




Comentários

  1. Curti bastante sua postagem. A grande dificuldade que tive foi sempre, estabelecer limites. Referências específicas para o mestte são muito boas.

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    1. Atualmente o maior desafio que enfrento quando quero jogar GURPS é passar pela criação de personagens e apresentar o jogo para novatos no sistema. Os jogadores no meu grupo não gostam de personagens pré-construídos e eu não tenho mais a mesma energia e disposição que já tive noutros tempos para passar GURPS adiante.

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  2. Parabéns pelo texto. Também adquiri meu livro pela promoção da Amazon. Em GURPS, sempre senti falta desse apoio que "How to be a Gurps GM", traz. Uma das primeiras coisas que leio em qualquer livro de RPG é o capítulo destinado aos mestres. Sou fascinado pela arte de contar histórias e mestrar. Antes de adquirir "How to be a Gurps GM", comprei "Gurps for Dummies". A razão disso é porque eu queria um pouco mais do que o MB traz . Apesar do segundo ser mais robusto do que o primeiro, recomendo ter os dois. Eles se complementam muito bem. Ainda assim, caso tivesse que escolher apenas um, ficaria com a edição "For Dummies". Ela traz muito mais material e ajuda novos MJs com mais naturalidade, sem esquecer dos veteranos.

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    1. Sim, me parecem livros que passam informações de caráter essencial ao jogo, pois o livro básico joga muitas ferramentas nas mãos dos mestres e jogadores sem passar de forma clara quais e como usá-las para otimizar a experiência do jogo. Isso pesa muito para os novatos, mas pode ser trabalhoso para mestres veteranos que estejam enferrujados (como eu).

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  3. Preciso ler esse livro... Muito empolgado para ver no que ele pode me ajudar.

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  4. A Steve Jackson deveria disponibilizar este livro de graça, hehehe!

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  5. gostei da análise do livro, ajudou quanto a dúvida de comprá-lo ou não.

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  6. Tenho meus livros de GURPS 4, mas nem sei a quanto tempo não jogo GURPS. Quando vi esse livro, fiquei bem interessado, mas ele surgiu em um momento inviável. Reacendeu uma chama para voltar a jogar GURPS, mesmo que eventualmente. Devo comprar minha cópia nas próximas semanas.

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